Eu ganhei esse livro de uma professora minha no ensino fundamental. Ela tinha o costume de esvaziar sua estante e levar alguns de seus exemplares para quem tivesse interesse na leitura. Todo Dia foi o livro que mais me chamou a atenção entre os que ela havia levado. Uma frase estampada em um pequeno pôster na capa, que anunciava a adaptação para o cinema, despertou minha curiosidade:
Filmes e livros de romance sempre chamam a minha atenção, ainda mais quando seguem um roteiro não tão convencional para falar sobre o amor. Este, em especial, mostra que não existe um “padrão” para amar.
Em resumo, o narrador, nomeado apenas como “A”, é uma espécie de entidade que não possui uma forma física própria. Todos os dias, ele acorda em um corpo diferente. No corpo de outra pessoa.
Para facilitar o entendimento, ele “possui” o corpo de alguém, mas não por escolha ou vontade. Desde o início de sua existência, tudo sempre foi assim. O que “A” sabe até agora é que tem 16 anos, porque sempre habita corpos de pessoas com essa mesma idade.
O livro começa com “A” acordando em um novo corpo. Para ele, é apenas mais um dia normal. Apenas 24 horas para assumir o controle de uma nova vida.
As primeiras coisas que faz ao acordar são acessar as memórias daquela pessoa para conseguir se adaptar e passar o dia sem causar estranhamento. Ele tenta interferir o mínimo possível na vida da pessoa, para não prejudicar ninguém. Essa é uma de suas regras mais fortes. Afinal, a vida não é dele. No dia seguinte, estará longe, em um corpo diferente. Deixar uma bagunça seria injusto.
Nesse dia, ele acorda no corpo de Justin, um colegial de 16 anos.
Justin é namorado de Rhiannon. Ao acessar as memórias de Justin, “A” percebe que a relação deles não é estável. É o típico relacionamento em que uma parte está emocionalmente ausente, enquanto a outra ainda tenta manter o laço.
Justin é frio e distante; Rhiannon é sensível e sentimental.
Ao perceber isso, “A” não consegue ignorar. Mesmo com sua regra de não interferir, ele interfere. Sente a infelicidade de Rhiannon e tenta transformar aquele dia em algo leve e bonito.
Ele a vê, algo que Justin não fazia. Dá atenção aos detalhes, escuta, trata com delicadeza e mostra afeto genuíno. Ela sente que Justin está diferente. Percebe que algo mudou.
“A”, por sua vez, também sente algo inédito: amor. Mas sabe que, no dia seguinte, tudo mudará. Não estará mais ali, e Justin nem sequer se lembrará daquele momento. Afinal, as pessoas que “A” habita não têm consciência do que aconteceu. Para elas, tudo se apaga, como se nunca tivesse existido.
Isso frustra Rhiannon, que percebe que Justin continua o mesmo de sempre. Como poderia ter mudado tanto em um dia e, de repente, voltado ao velho comportamento frio?
Parecia outra pessoa. E é outra pessoa.
No dia seguinte, “A” ainda pensa em Rhiannon. Sente aquele amor de forma intensa. Pela primeira vez, deseja permanecer. Não queria mudar a relação entre Rhiannon e Justin, queria mostrar que ela merecia mais. Alguém que a enxergasse de verdade. Sabia que isso significaria quebrar suas próprias regras, mas, ainda assim, queria tentar.
Através de um novo corpo, entra em contato com Rhiannon. Envia um e-mail misterioso que desperta a curiosidade dela. A partir disso, vai se desenvolvendo a trama romântica.
“Oh, they say people come, say people go. This particular diamond was extra special.”
Esse livro se tornou um dos meus favoritos, pois fala sobre o amor de forma pura e verdadeira. Depois de ler, a gente se questiona: o que realmente define o amor de alguém por nós?
Nosso corpo? Nosso gênero? Ou nossas emoções?
É possível amar além da aparência?
Rhiannon achava absurda a ideia de se apaixonar por alguém sem forma física, que mudava de corpo todos os dias. Mas, ainda assim, sentia algo profundo por “A”. Algo que ia além da aparência, que tocava a essência. Ela o reconhecia, mesmo à distância. E isso tornava tudo mais intenso e verdadeiro.
O amor começa quando você enxerga além do exterior. Quando busca aquilo que permanece no interior da pessoa. Não espera grandes gestos, mas pequenas atitudes que revelam mais.
Em um único dia, “A” fez Rhiannon se sentir especial. Vista. Diferente de Justin, que por mais que estivesse presente, era ausente. Nunca a fazia se sentir única.
“A” e Rhiannon tiveram uma conexão única e verdadeira. “A” não imaginava que pudesse amar, ou ser amado, por conta de sua condição. Já Rhiannon, não sabia que poderia ser escutada e enxergada da forma que sempre desejou. Mas “A” mostrou que isso não era difícil, só precisava ser feito por quem realmente a amasse.
Eles não tentaram preencher vazios, porque o amor não é sobre preencher o que falta, e sim, sobre construir. Construir algo novo, mostrar o que antes não se via. Mesmo com todas as dificuldades, permanecer firmes no sentimento.
O que encanta em Todo Dia é essa busca constante entre os dois. É sobre como o amor dá força para ir além, mesmo quando tudo parece impossível. Eu sei que é ficção… Mas, e se existisse alguém disposto a lutar por você, mesmo sem saber quem você é por completo? Alguém que olhou para sua alma, seu jeito, seu caráter e aquilo que é mais precioso e muitas vezes invisível: sua essência. Um amor que supera barreiras, que floresce mesmo em terreno instável.
E se pudéssemos viver em um corpo diferente a cada dia? Conhecer outras vidas, histórias, lugares?
Parece mágico, quase um sonho, mas cruel. Uma prisão. Viver condenado a vagar, sem uma identidade própria.
E se, como “A”, nos apaixonássemos, mas não pudéssemos viver esse amor da forma que desejamos? Até onde iríamos?
Fazer o que “A” fez seria certo? Seria justo sacrificar a liberdade de alguém por um desejo nosso?
Todo Dia tem duas continuações. O link estará aqui para quem se interessar na leitura. Recomendo demais. É uma leitura diferente, envolvente e que te faz refletir profundamente ao final.
O amor, como você disse, não é sobre preencher vazios, mas construir juntos, passo a passo, dia após dia, na insistência de um gesto, na atenção ao detalhe que transforma o ordinário em sagrado.
Achei tão interessante essa escrita! Me lembro de assistir algum filme no mesmo enredo. Que legal essa observação! Adorei.